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Perguntas Frequentes sobre o Regulamento Geral de Proteção de Dados da Câmara Municipal de Sintra
A sua estreia discográfica deu-se em formato mixtape em 2007 com o título “Niggativo”. Em 2012 surgiu o seu trabalho discográfico “Krónicas de G’z”, por muitos considerado como um álbum de referência no panorama do rap, e a marcar o dia 25 de abril deste ano gravou um trabalho conjunto com Charlie Beats, Rowdy, DJ X-Acto e Mal Amados, o impactante tema “Voz de Abril” em vídeo. Alguns dias depois de lançar “Salmos 3”, falámos com Marcos Best, rapper da Serra das Minas, um músico cada vez mais presente no nosso panorama musical.
Marcos, quando decidiu começar a cantar, e qual a sua motivação inicial?
O Rap apareceu na minha vida de forma muito natural, assim como qualquer criança pega numa bola de futebol e dá uns toques nos bairros da periferia, todas os miúdos que gostam de rap costumam escrever algumas rimas e improvisar em rodas de amigos, e assim foi comigo, passei toda a minha adolescência a improvisar, a escrever versos soltos e algumas canções, inspirado por rappers que eu ouvia como general D., Boss AC, Chullage, 2pac e até o coletivo Da Weasel. Em 2006 tive oportunidade de gravar os primeiros temas com uma péssima qualidade mas que ainda assim tiveram um enorme sucesso na minha comunidade, foi ai que decidi investir numa carreira.
O fato de dar voz a pessoas mais desfavorecidas que nunca são ouvidas e poder contar as minhas histórias, ter a noção que sou um Mc diferente no panorama do hip hop nacional e o meu gosto pela poesia e arte foram e continuam a ser os ingredientes que me motivam e inspiram a escrever e a cantar.
Em 2012 lancei o meu 1º álbum “krónicas de G’z”, e para mim foi a confirmação de que tenho de continuar a criar. A quantidade de pessoas que se identifica com o que escrevo e o facto de ganharem forças com a minha música, faz-me sentir grato todos os dias e lembra-me que continuo a ter uma missão a cumprir, e isso ultrapassa todos os parâmetros do rap, da estrada, dos concertos, holofotes e cachets. Para mim, trata-se de fazer hip hop.
O Marcos tem uma ligação forte com Sintra. Quer falar-nos um pouco dela?
Desde 1990 vivo no bairro da Serra das Minas, estudei na Tapada das Mercês durante 6 anos da minha vida, e ainda hoje vivo na Serra das Minas. Tive uma infância privilegiada no meio dos montes e matos do meu bairro, apesar de toda a pobreza e outros problemas, nós eramos crianças muito felizes, brincávamos na rua sem problemas, éramos livres para subir às árvores, cair e levantar, fazer cabanas, apanhar pinhões, nêsperas, uvas, amoras, correr atras de pássaros, coelhos, borboletas até cobras, ratos rãs e morcegos, para os mais corajosos, respirávamos criatividade e imaginação. Na adolescência íamos passear em Sintra, descer aquelas ruas loucas três rapazes em cada bicicleta, todas sem travões, invadíamos piscinas no verões quentes, várias tardes passámos na piscina da casa do gaiato, subíamos a mata de Sintra, Rio da Mula, Lagoa Azul, miradouro de Santa Eufémia... Bons tempos, os meus amigos eram meus irmãos e os meus irmãos eram meus amigos, tudo com o Palácio da Pena no horizonte. Pena foi que nunca tivemos o mesmo tratamento que a zona histórica da vila de Sintra, ainda assim vi toda a minha zona crescer, o mato a transformar-se em prédios, a estrada de poeira a ganhar alcatrão, grandes lojas nascerem para saciar o nosso consumismo, a heroína a ser substituída por ácidos e cocaína, a GNR a dar lugar à PSP, mas no fundo os problemas continuam enraizados naquela esquinas, pouca coisa mudou realmente para além da evolução do betão.
Quais são os principais problemas que afetam a juventude no nosso concelho?
Ao viver em Sintra, a sensação que tenho é que ninguém se importa. Ninguém quer saber da vida dos jovens, das suas necessidades e das loucuras pelas quais nós passamos. A taxa de reclusão entre os mais jovens continua a crescer, e são poucas ou nenhumas as medidas tomadas no sentido de prevenir esta situação. Não existe nenhuma entidade que venha até nós e pergunte o que se passa, quais são as nossas necessidades, com todo o respeito, mas as poucas associações que existem não fazem o trabalho bem feito, em alguns casos por falta de meios mas noutros é por pura incompetência. Não existe apoio ao imigrante, conheço dezenas de jovens que não possuem documentação portuguesa e alguns deles até nasceram cá, mas ainda assim não sabem o que fazer ou onde se dirigir para regularizar a sua situação. A falta de voz também assusta-me, existe um mundo paralelo a acontecer em Sintra e ninguém nos ouve, ninguém se levanta a sério para mostrar o que se passa, eu próprio em altura de eleições fui contatado pelo PS, PSD, e várias vezes colaborei com a CDU e JCP, as promessas eram grandes, mas não passaram disso, depois das eleições nada foi feito.
A reinserção social não existe em Sintra, arranjam-se as estradas, tratam-se os matos, constroem-se prédios, mas os bairros continuam sujos, isolados, degradados, a segregação e a discriminação são reais em Sintra e afetam de forma muito direta a vida dos nossos jovens. Crescemos ali, atirados para um canto que chamamos de lar, em bairros sem condições onde a exposição ao crime é constante. No bairro onde vivo, por exemplo, não existe um único parque infantil nem um campo para jogar a bola ou um jardim para fazer um churrasco, mas existem 2 bares de alterne... É estranho!
Acha que há um panorama musical sintrense? Gostaria de destacar alguns nomes ou grupos?
Sinceramente, pouco conheço da música que se faz em Sintra sem ser dentro do hip hop, gosto da banda de reagge Chappa Dux, de resto, falar de rap e falar da linha de Sintra quase que é sinónimo, é uma escola gigante em termos de rap. Posso destacar nomes como Bispo, Grog Nation, Landim, Thug pkp, Kba, Mc Ary, Ferry, Timas e muitos outros grandes mcs, produtores gigantes como, challie beats, taser, intakto entre outros. Apesar de existir muito talento nestas zonas não existem bares, festas ou festivais onde seja possível atuarmos para o nosso público, existem dezenas de festas na altura de junho e julho e não se vê estes nomes a tocar. Enquanto isso não muda, o nosso público tem de andar quilómetros para nos ver atuar.
Quais foram até agora os momentos mais marcantes da sua carreira?
Ainda está por vir! Mas posso dizer que o concerto que dei na festa de Natal no Instituto Prisional de Lisboa foi algo que me tocou muito mesmo!
Multiculturalismo e Lusofonia. O que significam estas palavras para si?
Lusofonia para mim é um universo muito rico, sou realmente admirador da literatura lusófona, dai também a minha vontade de escrever sempre em português, penso em português vivo em português e é assim que tenho de escrever também. Admiro muito a obra de Fernando Pessoa, Ondjaki, Mia Couto, Chico Buarque entre outros.
No panorama musical também encontro grandes influências, embora menores, se comparadas com a literatura.
Multiculturalismo é uma ideia fantástica, o ser humano só tem a ganhar com isso mas a meu ver ainda não interiorizamos realmente o que é o multiculturalismo e a força que esta ideia tem se for vivida na sua plenitude, sem qualquer tipo de reservas. Acredito que poderíamos assim usufruir de tudo o que o ser humano tem de melhor ao invés de simplesmente vivermos juntos na mesma cidade, vendo-nos, cruzando-nos mas sem nos tocarmos.
Que sugestões deixaria aos decisores políticos sobre a forma como divulgar e promover as ideias e projectos dos jovens?
Penso que seria bom se adotassem políticas de proximidade aos jovens, promovendo wokshops, torneios de futebol, ou qualquer outro desporto, marcando presença nas redes sociais também.
Principalmente desafiava-os a saírem à rua (sem ser em campanha) estarem com os jovens, tentarem perceber-nos e perguntarem diretamente quais são as nossas necessidades. Façam-se presentes no nosso meio, vejam com os vossos olhos, e percebam a nossa realidade antes de tomarem decisões e promoverem ações que não terão resultados práticos. Não deverá ser difícil para qualquer autarquia criar um departamento que trabalhe no terreno, perto dos jovens, tentando perceber a sua realidade, necessidades e vontades, e aí sim, tomar decisões bem enquadradas! Se não tiverem ninguém capaz, eu candidato-me ao cargo de boa vontade!
A música deve ser interventiva? E estará a sê-lo?
Não considero que toda a música deva ser interventiva até porque nem todos os letristas têm vocação para isso, e o fato de haver vários estilos de música só enriquece a arte.
Eu defendo que a arte deve refletir a sociedade e a realidade atual em que vivemos mas isso fica ao critério de cada um. Se tivermos em conta a quantidade de pessoas que nos ouve e inspira-se com a nossa música talvez devêssemos mesmo pensar um pouco mais no que andamos a cantar. Por outro lado, é complicado auto censurarmos a nossa música em prol do protesto, do mercado, ou por qualquer outra razão. Este é um tema complicado para mim, mas é claro que me revolta ver musicas e artistas vazios a dominarem as nossas rádios e festivais enquanto que artistas com mensagens poderosíssimas continuam no anonimato. Infelizmente é assim que a sociedade está montada, enche-se as pessoas com entretenimento barato para que ninguém perceba o que se passa na realidade. Tenho pena que tantos músicos se contentem em ser meros fantoches, quando podiam fazer algo com valor real.
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