10 OBRAS DE LEAL DA CÂMARA
O Muro do Derrête
Aguarela s/ papel; 47,5cm x 35,5cm
Leal da Câmara (n. ass.), s. d.; Inv. 9/PIN/1996
Cancan no ‘Folies’
Óleo s/madeira; 101,7cm x 79,5cm
Leal da Câmara (ass.), s. d.; Inv. 11/PIN/1994
Esta obra demonstra bem o ambiente de cabaret e de espetáculo que Leal da Câmara frequenta em Paris. Com ateliê em Montmartre, o artista luso vive então os seus anos de glória. Entre 1900 e praticamente 1915, a capital francesa e, por sua influência, toda a Europa, conhece, por assim dizer, o seu risco escalpelizante, divulgado em bastas publicações de inequívoca qualidade, onde o seu talento sobressaiu e onde foi reconhecido por todos. Este período correspondeu, ainda, ao auge de todo o seu percurso artístico, em que Leal da Câmara triunfou e emergiu, destacado e sem favores, de entre uma vasta plêiade de ilustres caricaturistas. Convive e é contemporâneo de muitos artistas de então, como é o caso de Henri de Toulouse-Lautrec, cujas influências são bem notórias neste Cancan no ‘Folies’ (dança francesa tecnicamente tida como uma mistura da polca e da quadrilha).
O Douro
Guache s/cartão; 100 x 70cm
Leal da Câmara (ass.), s. d. [1915-192 0]; Inv. 30/PIN/1993
O Arranha-céus (Roosevelt)
Guache e aguarela s/cartolina; 69,5cm x 98cm
Leal da Câmara (ass. L.C.), s. d.; Inv. 29/PIN/1994
O percurso existencial de Leal da Câmara perpassa por vários acontecimentos políticos mundiais de relevo, como foram os casos das duas Grandes Guerras. Em 1947, terminada a II Guerra Mundial há quase dois anos, Leal executa ainda uma série de obras de grande formato e pincelada larga retratando os aliados vencedores do conflito – De Gaulle, Churchill, Estaline e Roosevelt. São todas obras muito expressivas, de fácil interpretação e leitura simples. Nesta composição vê-se um arranha-céus de Manhattan, ao qual se sobrepõe e sobreeleva a efígie do presidente norte-americano Franklin Delano Roosevelt (1882-1945), 32.º Presidente dos Estados Unidos da América, o qual fez os EUA entrarem na Segunda Grande Guerra, após o ataque a Pearl Harbour, mas que é também tido como o obreiro da grande recuperação norte-americana depois da crise de 1929.
A ‘Dança do Urso’, por Gaby Deslys
Pastel e lápis s/papel; 28,4cm x 38,9cm
Leal da Câmara (ass.), s. d.; Inv. 184/PIN/1993
Ainda hoje a origem e a identidade de Gaby Deslys (1881-1920) persiste envolta em mistério. Mas o certo é que, no seu tempo, foi considerada como uma brilhante cantora, corista de cabaret e atriz, para além de ter sido uma das mulheres mais belas de então. Viajou em tournée por toda a Europa e Estados Unidos e foi uma das atrizes mais bem sucedidas e melhor pagas dos princípios do século XX. Teve uma carreira fulgurante, com grandes sucessos de bilheteira e multidões enlouquecidas, para além de ter sido cortejada por grandes empresários, políticos, milionários, príncipes e monarcas. Ao que parece, foi amante de vários deles, mas o seu caso amoroso mais mediático e polémico foi o que manteve com D. Manuel II, último rei de Portugal. A relação inicia-se em 1909, aquando da visita do monarca a Paris, altura em que nasce uma paixão avassaladora entre ambos, ao que se seguem as visitas de Gaby a Lisboa e as prendas milionárias de jóias de D. Manuel à cantora. O escândalo tomou grandes proporções, tendo contribuído para abalar a imagem do monarca e para a sua deposição. A ‘paixão’ arrefece em 1911, com a ida da artista para Nova Iorque e termina em 1913, com o casamento de D. Manuel II, já no exílio. Nesta obra, Gaby Deslys executa a sua célebre ‘Dança do Urso’ (executada ao som da inovadora música ‘jazz band’ interpretada por negros), tendo como adereços de palco a coroa e o ceptro reais portugueses.
Rainha Cristina de Espanha (Maria Cristina de Áustria)
Óleo s/contraplacado; 49,5cm x 100cm
Leal da Câmara (ass.), Madrid, s. d.; Inv. 5/PIN/1994
Depois das terríficas caricaturas políticas concebidas no Portugal dos finais do século XIX, e pelos seus manifestos ideais republicanos, Leal da Câmara vê-se obrigado a exilar-se em Espanha, para onde parte (Madrid) em 1898. Leva uma vida boémia e colabora em várias revistas e jornais madrilenos. Mas o país vizinho era muito próximo e também ‘enfermava’ por ser uma monarquia velha de séculos. Vive na capital espanhola por cerca de três anos, após o que parte para a ‘cidade das luzes’, nos alvores da nova centúria. Era então regente de Espanha a rainha viúva de Afonso XII, D. Maria Cristina de Habsburgo-Lorena (1858-1929), que Leal retrata magnificamente neste óleo, de cores sombrias e pose grave. Embora os dezassete anos de regência da Rainha Cristina de Espanha fossem pautados por diversas lutas políticas, alguma conflitualidade social e crises diplomáticas, ainda assim foi-lhe sempre reconhecida a impecável observância das obrigações constitucionais.
O Chefe de Estado em Portugal
Aguarela e tinta-da-china s/papel; 56cm x 68cm
Leal da Câmara (ass.), 1897; Inv. 2/PIN/1994
O traço certeiro e o humor acutilante de Leal da Câmara posto ao serviço da causa republicana, saldou-se num conjunto soberbo de caricaturas políticas, em que quase ninguém, nos finais de oitocentos, escapou à sua crítica incisiva. Todavia, um personagem se destaca por sobre todos os demais – o Rei D. Carlos I (1863-1908). Símbolo por excelência do decrépito Regime Monárquico, velho de mais de seis séculos, personificava nessa altura todos os males de que padecia o país e, como tal, era a figura-alvo da imprensa, dos caricaturistas e das revistas de humor. Leal da Câmara dedica-lhe, tanto quanto se sabe, pelo menos 105 caricaturas, tornando-se o monarca o político mais representado em toda a sua obra. Apesar disso, o Mestre reconhecia em D. Carlos um brilhante artista, para além dos manifestos conhecimentos em ornitologia e oceanografia.
Feira de São Pedro de Penaferrim
Óleo s/contraplacado; 93 x 93cm
Leal da Câmara (n. ass.), s. d. [1930-1948]; Inv. 129/PIN/1993
Guerra Junqueiro
Pastel s/papel; 45,4cm x 45,9 cm
Leal da Câmara (ass.), s. d.; Inv. 106/PIN/1993
Escritor e jornalista de renome, Guerra Junqueiro (1850-1923), foi ainda o poeta mais popular da sua época e o maior representante da denominada ‘Escola Nova’. É considerado um ‘poeta panfletário’, embora detentor de um certo romantismo social, tendo a sua poesia contribuído para a criação do ambiente revolucionário que conduziu à implantação da República Portuguesa. Aliou, durante toda a sua vida, a escrita com o funcionalismo público e a política, mas, a certa altura, retira-se para junto do Douro, e orienta, a partir daí, a sua obra para a terra e para ‘os simples’, surgindo publicações impregnadas por um forte saudosismo de recordações calmas e consoladoras, verdadeira ternura pela paisagem social que o envolve. Sempre lhe foi reconhecida a sua genialidade como satírico e como lírico, mesmo por parte dos seus opositores políticos. Anticlericalista ferrenho e assumido publica, em 1885, a polémica obra A Velhice do Padre Eterno, autêntico libelo contra o obscurantismo da Igreja e contra o Clero de então, cuja edição de 1911 contou com a arrojada colaboração artística de Leal da Câmara.
Tríptico ‘Pax’ (Conflitos Regionais)
Aguarela s/papel; 46 x 66,5cm; 73 x 66,5cm; 46,5 x 66,5cm
Leal da Câmara (n. ass.), s. d. [1939-1945]; Inv. 23, 24, 25/PIN/1994
Leal da Câmara, nos seus exílios, e tal como fizera antes em Portugal, continuou a fixar em caricatura sarcástica todas as altas individualidades internacionais que eram protagonistas, nesse tempo, dos acontecimentos políticos que se sucediam então. Tanto em Madrid, como depois, e sobretudo, em Paris, o artista volveu-se como repórter gráfico de tudo o que acontecia, registando todas as ações dos governantes e monarcas europeus e mundiais ao pormenor e incidindo nos seus trabalhos uma direta crítica sem tréguas aos mesmos. Tal pode ser atestado, não só nas inúmeras publicações europeias em que colaborou, como sejam as revistas espanholas Madrid Comico, Revista Vinicola Ilustrada, El Imparcial ou La Vida Literaria, mas, sobretudo, nas revistas francesas, como Le Rire, La Caricature, o Le Cri de Paris, Gil Blas, Le Bon Vivant, La Vie por Rire, Le Journal pour Tous e L’ Assiette au Beurre, neste caso por mais de 11 anos consecutivos (1901-11), como também nos inúmeros trabalhos que executou já depois do seu regresso definitivo ao nosso país, em 1915, de que é exemplo magistral este Tríptico ‘Pax’ (Conflitos Regionais), onde se vê o Zé Povinho, Marianne, Hitler, Jonh Bull, Tio Sam, Estaline, Gandhi, Mussolini e Haile Selassie, entre outros, envolvidos todos em conflitos regionais.